A escola reflete o que ocorre na nossa sociedade.
Não é raro serem notificados na mídia casos significativos de violência nos quais o bullying tem sido associado como sua causa principal. Especificamente sobre o que ocorre nas escolas, também é frequente ser atribuída a responsabilidade ao professor, de modo unilateral.
O fato é que, pensando dessa forma, acabamos por ignorar o papel de toda a sociedade nesses casos, inviabilizando reflexões e discussões mais profundas. Por exemplo: O que o bullying, de fato, significa? O que tem sido feito, de forma consistente, durante o processo de formação dos professores, para que eles saiam das universidades aptos a lidarem com situações de bullying, no espaço escolar? O bullying acontece somente na escola? O que esses fatos restritos a espaços escolares sugerem? Qual será o papel da mídia nesses casos: será que ela superestima a violência; e até mesmo incentiva a própria intolerância e preconceito (luta de classes, homofobia, racismo, preconceito contra a mulher e intolerância religiosa, por exemplo)? Será que ela mesma, ao descrever tragédias assim, reforça estereótipos, algumas vezes de forma simplista e até mesmo tendenciosa? E o sistema econômico no qual estamos inseridos, será que ele não incentiva o paradoxo entre aqueles considerados vencedores e os perdedores?
No caso específico do que ocorreu na Escola Municipal Tasso da Silveira (em Realengo, na Zona Oeste do Rio, no dia sete de abril de 2011, considerada a maior tragédia ocorrida dentro do espaço escolar em nosso país), por que será que Wellington de Menezes, ao atirar, teve como alvo principal as garotas; e por que pouco se frisa essa questão? Se, no caso, ele tivesse dado preferência a pessoas negras, ao atirar, a mídia não estaria falando em preconceito racial? E por que também pouco se fala das hostilidades que ele sofreu, quando estudava naquele espaço; como o fato de terem colocado a sua cabeça na privada, dando descarga logo em seguida?
Por que rapidamente nos esquecemos de situações degradantemente significativas, como o caso de Geisy Arruda, a garota que quase foi linchada pelos colegas por um motivo “muito relevante”: o comprimento de seu vestido; da garota paulistana que, via twitter, incitava o ódio aos nordestinos, com as frases (sic) "Nordestisto não é gente. Faça um favor a São Paulo: mate um nordestino afogado!"; ou de Jair Bolsonaro, dizendo que um filho dele jamais namoraria uma negra, pois são suficientemente bem-educados para não se submeterem a esse tipo de promiscuidade – corrigindo-se, depois, dizendo que entendeu a palavra “gay” ao invés de “negra”, como se justificando tal agressão? E o que falar dos homossexuais que foram agredidos com lâmpadas incandescentes, e aqueles vários outros que são agredidos todos os dias, em todo o país, como o caso que ocorreu em Itarumã-GO, no qual uma garota lésbica foi morta pelos familiares de sua namorada?
E qual a nossa postura diante de todas essas questões, que permeiam a nossa sociedade a todo o momento? Será que não reproduzimos alguns desses comportamentos? Quem nunca “curtiu” com um colega de classe por ele ser diferente, sob o seu ponto de vista? Quando estamos de carro, será que negligenciamos aqueles que estão a pé, ou os que possuem veículos menos elegantes que os nossos; mas, quando estamos a pé, ficamos chateados com a truculência de alguns motoristas? Não é interessante reconhecer que, em diversas situações diferentes, assumimos tanto o papel de opressores quanto o de oprimidos? E como nos sentimos quando vivemos cada um desses papéis?
Assim, tais tragédias não devem somente chamar a nossa atenção pela barbaridade com que são realizadas. Devemos ter em mente que, na grande maioria dos casos, são exceções, reações extremas, realizadas por alguém que não teve inteligência emocional o bastante para lidar com as adversidades, muitas vezes deveras dolorosas, injustas ou mesmo degradantes, provocadas pela sociedade que construímos. Assim, não significa também que todas as pessoas mais reclusas, com algum problema psiquiátrico, ou que sofrerem preconceito ou grandes traumas na vida têm vontade, ou um dia irão cometer um ato assim.
Pensando sob esta ótica, devemos buscar respostas mais profundas e avaliar nossos comportamentos com aqueles que nos cercam, mesmo de forma indireta. A escola tem um interessante papel nesse sentido, já que é um espaço no qual os estudantes passam boa parte do seu tempo, e que, de certa forma, é uma minirrepresentação da sociedade em que vivemos.
Casos de desrespeito não devem ser tolerados e, para tal, não bastam unicamente punições, mas um trabalho anterior de desconstrução de valores, e que começa dos próprios educadores, coordenadores e direção, por exemplo, evitando estigmatizar alunos. Discussões em sala; criação de uma “central anônima”, na qual o aluno pode denunciar casos assim; e abertura para o diálogo; são medidas igualmente relevantes. O texto “Lidando com o bullying na escola”, também do Canal do Educador, fornece dicas pontuais sobre esse assunto.
Por Mariana Araguaia - Bióloga, especialista em Educação Ambiental - Equipe Brasil Escola
Não é raro serem notificados na mídia casos significativos de violência nos quais o bullying tem sido associado como sua causa principal. Especificamente sobre o que ocorre nas escolas, também é frequente ser atribuída a responsabilidade ao professor, de modo unilateral.
O fato é que, pensando dessa forma, acabamos por ignorar o papel de toda a sociedade nesses casos, inviabilizando reflexões e discussões mais profundas. Por exemplo: O que o bullying, de fato, significa? O que tem sido feito, de forma consistente, durante o processo de formação dos professores, para que eles saiam das universidades aptos a lidarem com situações de bullying, no espaço escolar? O bullying acontece somente na escola? O que esses fatos restritos a espaços escolares sugerem? Qual será o papel da mídia nesses casos: será que ela superestima a violência; e até mesmo incentiva a própria intolerância e preconceito (luta de classes, homofobia, racismo, preconceito contra a mulher e intolerância religiosa, por exemplo)? Será que ela mesma, ao descrever tragédias assim, reforça estereótipos, algumas vezes de forma simplista e até mesmo tendenciosa? E o sistema econômico no qual estamos inseridos, será que ele não incentiva o paradoxo entre aqueles considerados vencedores e os perdedores?
No caso específico do que ocorreu na Escola Municipal Tasso da Silveira (em Realengo, na Zona Oeste do Rio, no dia sete de abril de 2011, considerada a maior tragédia ocorrida dentro do espaço escolar em nosso país), por que será que Wellington de Menezes, ao atirar, teve como alvo principal as garotas; e por que pouco se frisa essa questão? Se, no caso, ele tivesse dado preferência a pessoas negras, ao atirar, a mídia não estaria falando em preconceito racial? E por que também pouco se fala das hostilidades que ele sofreu, quando estudava naquele espaço; como o fato de terem colocado a sua cabeça na privada, dando descarga logo em seguida?
Por que rapidamente nos esquecemos de situações degradantemente significativas, como o caso de Geisy Arruda, a garota que quase foi linchada pelos colegas por um motivo “muito relevante”: o comprimento de seu vestido; da garota paulistana que, via twitter, incitava o ódio aos nordestinos, com as frases (sic) "Nordestisto não é gente. Faça um favor a São Paulo: mate um nordestino afogado!"; ou de Jair Bolsonaro, dizendo que um filho dele jamais namoraria uma negra, pois são suficientemente bem-educados para não se submeterem a esse tipo de promiscuidade – corrigindo-se, depois, dizendo que entendeu a palavra “gay” ao invés de “negra”, como se justificando tal agressão? E o que falar dos homossexuais que foram agredidos com lâmpadas incandescentes, e aqueles vários outros que são agredidos todos os dias, em todo o país, como o caso que ocorreu em Itarumã-GO, no qual uma garota lésbica foi morta pelos familiares de sua namorada?
E qual a nossa postura diante de todas essas questões, que permeiam a nossa sociedade a todo o momento? Será que não reproduzimos alguns desses comportamentos? Quem nunca “curtiu” com um colega de classe por ele ser diferente, sob o seu ponto de vista? Quando estamos de carro, será que negligenciamos aqueles que estão a pé, ou os que possuem veículos menos elegantes que os nossos; mas, quando estamos a pé, ficamos chateados com a truculência de alguns motoristas? Não é interessante reconhecer que, em diversas situações diferentes, assumimos tanto o papel de opressores quanto o de oprimidos? E como nos sentimos quando vivemos cada um desses papéis?
Assim, tais tragédias não devem somente chamar a nossa atenção pela barbaridade com que são realizadas. Devemos ter em mente que, na grande maioria dos casos, são exceções, reações extremas, realizadas por alguém que não teve inteligência emocional o bastante para lidar com as adversidades, muitas vezes deveras dolorosas, injustas ou mesmo degradantes, provocadas pela sociedade que construímos. Assim, não significa também que todas as pessoas mais reclusas, com algum problema psiquiátrico, ou que sofrerem preconceito ou grandes traumas na vida têm vontade, ou um dia irão cometer um ato assim.
Pensando sob esta ótica, devemos buscar respostas mais profundas e avaliar nossos comportamentos com aqueles que nos cercam, mesmo de forma indireta. A escola tem um interessante papel nesse sentido, já que é um espaço no qual os estudantes passam boa parte do seu tempo, e que, de certa forma, é uma minirrepresentação da sociedade em que vivemos.
Casos de desrespeito não devem ser tolerados e, para tal, não bastam unicamente punições, mas um trabalho anterior de desconstrução de valores, e que começa dos próprios educadores, coordenadores e direção, por exemplo, evitando estigmatizar alunos. Discussões em sala; criação de uma “central anônima”, na qual o aluno pode denunciar casos assim; e abertura para o diálogo; são medidas igualmente relevantes. O texto “Lidando com o bullying na escola”, também do Canal do Educador, fornece dicas pontuais sobre esse assunto.
Por Mariana Araguaia - Bióloga, especialista em Educação Ambiental - Equipe Brasil Escola
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